quinta-feira, 26 de abril de 2012

Projeto de Lei do Deputado Bruno Correia

 Os incômodos ‘DJs’ do transporte público

Passageiros dizem ficar indignados com aparelhos sonoros, mas têm medo de reclamar

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A universitária Thaís Veríssimo já foi incomodada por uma passageira que ouvia música sem fone de ouvido ao viajar do Rio para Teresópolis
Foto: Fabio Rossi / O Globo

A universitária Thaís Veríssimo já foi incomodada por uma passageira que ouvia música sem fone de ouvido ao viajar do Rio para Teresópolis Foto: Fabio Rossi / O Globo
RIO - O publicitário Wellington Amaral pegou o ônibus 696 ao sair da faculdade, como sempre fazia. Depois de um dia cansativo, mal sabia ele que teria uma viagem estressante. Ao seu lado, um rapaz ligou o celular e começou a ouvir música sem fone de ouvido. Como se já não bastasse um “DJ” durante a viagem, na outra fileira de bancos uma moça fez a mesma coisa. O rapaz, então, ligou um segundo celular para “competir” com a jovem. Por causa de situações como essa que a Assembleia Legislativa vota até o fim deste mês um projeto de lei que prevê multa de R$ 1 mil reais para passageiros que insistirem em ouvir som sem fone de ouvido e também para a empresa de transporte.
- Não só eu me senti incomodado, os outros passageiros do ônibus também. Mas eu fiquei quieto, assim como os outros, não falei nada porque faço tudo para evitar confusão – conta Wellington.
A economista Glaucia dos Santos, de 28 anos, passou por problema semelhante, mas decidiu não ficar calada. Enquanto dormia no ônibus da linha 2236, que faz o trajeto Campo Grande-Castelo, um homem ligou seu notebook e pôs um clipe musical para tocar – mais uma vez, sem usar fone de ouvido.
- Eu acordei assustada porque o som estava alto. Eu disse que o computador dele parecia muito moderno, mas que não tinham apresentado a ele um equipamento igualmente moderno, que é o fone de ouvido. Ele respondeu que estava sem fone e abaixou o volume. Eu reclamei, mas meu pai falou para eu não fazer mais isso porque posso apanhar na rua.
O medo de reclamar é justificável, principalmente diante de tantos casos de morte por motivo banal. Em março de 2010, um homem foi morto dentro de um ônibus em Botafogo depois de se recusar a fechar a janela. Isso sem falar nos casos fora do transporte público, como os que aconteceram porque alguém colocou lixo na calçada do vizinho ou reclamou de barulho durante a madrugada.
Segundo o deputado Bruno Correia, autor do projeto de lei, a multa de R$ 1 mil reais para passageiros mal educados e empresas de transporte que não tomam providências contra eles seria aplicada apenas em último caso:
- Primeiro há a recomendação de o próprio motorista ou funcionário da empresa orientar o passageiro a desligar o aparelho ou usar o fone. Não sendo cumprida, há a multa, que seria aplicada pela força policial mais próxima.
Sobre o valor da multa, que para alguns pode parecer um exagero, o deputado justifica:
- Isso é um parâmetro. A maioria das leis prevê multa nessa faixa. E, quando mexe no bolso, a população costuma pensar mais nos seus atos. O mais importante, entretanto, é a mudança cultural. Todos têm que respeitar o direito do próximo. Há momentos apropriados, e no coletivo isso não é adequado.
A proposta do deputado vale apenas para meios de transporte intermunicipais. O projeto de Bruno Correia já passou por algumas comissões da Casa. Se for aprovado, deverá coibir situações como a que universitária Thaís Veríssimo passou. Durante uma viagem de madrugada do Rio para Teresópolis, uma mulher ouvia uma rádio evangélica pelo celular, com o alto-falante ligado.
- Uma outra passageira foi até ela e pediu gentilmente para desligar a música porque estava incomodando os outros passageiros. Ela justificou que “a música era de Deus”. A moça respondeu: "tudo bem senhora, mas nem todos querem ser evangelizados e estão incomodados. Desligue, por favor". Ela se rendeu e desligou.
Como a lei se aplica a meio de transporte intermunicipal, outros beneficiados seriam os passageiros das barcas. O servidor público Evandro Pereira, de 29 anos, conta que em uma viagem de Niterói para o Rio, um homem ouvia um funk com letras pornográficas. Na ocasião, Evandro estava com o seu filho, que tinha 5 anos.
- Eu pedi pra ele: "amigo, por favor, pode desligar a música? Pela lei, é proibido usar aparelho de som em transporte público". Ele disse que não sabia que lei era essa, mas desligou. Mas logo em seguida ligou de novo. Então chamei um funcionário da Barcas S/A, que pediu para que ele desligasse. Só assim ele acatou.
Sem lei, decretos e portarias preveem apenas avisos proibitivos, mas não as providências
De fato, não há uma lei que proíba ouvir som em transporte público sem fone de ouvido. O decreto municipal n° 12.713/94 prevê apenas que os veículos devem ter um adesivo informando que é proibido usar aparelho de som. De acordo com a Secretaria Municipal de transportes, as autoridades dentro do ônibus são o motorista e/ou o cobrador e cabe a eles solicitar ao portador do equipamento de som que diminua o volume ou tomar as devidas providências para o bom andamento da viagem. Para as linhas intermunicipais, vale a portaria 437/97 do Detro, que proíbe aparelho sonoro no interior do veículo, mas não define sobre o que o usuário incomodado deve fazer.
Segundo a assessoria do Departamento, o passageiro pode reclamar ao motorista, que deve pedir que o aparelho seja desligado. Caso ele insista, o motorista poderá procurar a autoridade policial mais próxima ou um fiscal do Detro, se houver.
A Barcas S/A informou que também sinaliza as estações e as embarcações, orientando o usuário a não utilizar equipamentos que emitam som alto. Porém, os funcionários da empresa não podem obrigar ninguém a desligar o aparelho.
Segundo o MetrôRio, o Decreto Estadual nº 2.522/1979 prevê advertência ao passageiro que não atender à orientação de desligar ao aparelho de som. Os clientes que se sentirem incomodados devem procurar os agentes de segurança nas estações. Esses, apesar de não poderem retirar o cliente do metrô, orientam o passageiro a abaixar o volume ou usar fone de ouvidos.
No caso dos trens, a SuperVia informou que a atitude é considerada inconveniente pelo regulamento do transporte ferroviário, o decreto nº 1932/1996. Para garantir o bem estar dos demais passageiros, a atitude é coibida pelos agentes da concessionária, a quem os demais passageiros podem reclamar. Quem insistir no comportamento inconveniente poderá ser convidado a se retirar do trem.
Em outubro do ano passado, a concessionária iniciou uma campanha incentivando o uso do fone de ouvido. Segundo a SuperVia, a campanha foi elogiada por muitos passageiros, mas o número de reclamações não diminuiu.
Cigarro e aparelhos de som: avisos lado a lado, mas apenas um deles é baseado em lei
Na maioria dos meios transportes públicos existem avisos fixados, geralmente no interior, sobre as proibições – como conversar com o motorista, no caso dos ônibus; fumar e usar aparelhos sonoros.
A proibição ao fumo se baseia na lei estadual nº 5.517/2009, que não apenas proíbe, como prevê a retirada do usuário que insistir em fumar. Essa atitude é de responsabilidade da empresa, que, se não cumprir a lei, pode ser multada entre 1.548,63 e 15.486,27 UFIRs (Unidade Fiscal de Referência).
Para Wellington do Amaral, personagem do início da matéria, entretanto, uma lei para aparelhos sonoros não será suficiente:
- Todo mundo fica indignado quando alguém fuma no ônibus, mesmo que seja na janela. Acho que essa mesma indignação tem que ser usada nesse caso. Se houver uma lei que proíba, também acredito que deve haver uma campanha de conscientização.

Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/rio/os-incomodos-djs-do-transporte-publico-4728503#ixzz1tA3ifz7t
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